Papa Leão XIV: ‘que a Turquia esteja a serviço de uma paz justa e duradoura’
- Silvia Carvalho
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Por Mariangela Jaguraba – Vatican News

O Papa Leão XIV iniciou, nesta quinta-feira (27), a primeira viagem apostólica internacional. A primeira etapa da viagem do Santo Padre é a Turquia (Türkiye) por ocasião do aniversário de 1700 anos do Primeiro Concílio de Niceia. Leão XIV permanecerá no país até domingo (30).
Em seu discurso às autoridades, aos representantes da sociedade civil e ao Corpo Diplomático, no Palácio Presidencial, em Ancara, capital do país, o Papa agradeceu a cordial acolhida e manifestou alegria de iniciar as viagens apostólicas de seu pontificado a partir da Turquia, "uma vez que esta terra está indissoluvelmente ligada às origens do cristianismo e hoje convida os filhos de Abraão e toda a humanidade a uma fraternidade que reconheça e valorize as diferenças".
Um povo com uma grande história
De acordo com o Papa, a beleza natural da Turquia "nos convida a cuidar da criação de Deus" e "a riqueza cultural, artística e espiritual dos lugares onde" os turcos "vivem nos lembra que as grandes civilizações tomam forma no encontro entre gerações, tradições e ideias diferentes, nas quais o desenvolvimento e a sabedoria se unem".
“É verdade que o nosso mundo está marcado por séculos de conflitos e que, à nossa volta, ele continua sendo desestabilizado por ambições e decisões que espezinham a justiça e a paz. No entanto, diante dos desafios que nos interpelam, ser um povo com uma grande história representa um dom e uma responsabilidade.”
A seguir, o Papa Leão disse às autoridades que "a imagem da ponte sobre o Estreito de Dardanelos, escolhida como símbolo" de sua "viagem, expressa com eficácia o papel especial de seu país". "Vocês têm um lugar importante no presente e no futuro do Mediterrâneo e do mundo inteiro, ao valorizar, antes de tudo, as suas diversidades internas".
"Antes de unir a Ásia e a Europa, o Oriente e o Ocidente, essa ponte liga a Turquia a si mesma, compõe as suas partes e, assim, torna-a, de algum modo, a partir de dentro, um ponto de encontro de sensibilidades, cuja homogeneização representaria um empobrecimento. Com efeito, uma sociedade só está viva se for plural: são as pontes entre as suas diferentes almas que a tornam uma sociedade civil. Hoje em dia, as comunidades humanas estão cada vez mais polarizadas e dilaceradas por posições extremas, que as fragmentam", sublinhou o Pontífice.
A contribuição dos cristãos
“Desejo assegurar que pretendem contribuir positivamente para a unidade de seu país também os cristãos, que são e se sentem parte da identidade turca, tão apreciada por São João XXIII, recordado por vocês como o “Papa turco” pela profunda amizade que sempre o ligou ao seu povo.”
Leão XIV recordou que João XIII "foi Administrador do Vicariato Latino de Istambul e Delegado Apostólico na Turquia e na Grécia de 1935 a 1945". Ele "comprometeu-se intensamente para que os católicos não se distanciassem da construção de sua nova República", inspirando "uma lógica mais verdadeira e evangélica, que o Papa Francisco definiu como a 'cultura do encontro'".
O Papa recordou que do coração do Mediterrâneo, o seu "predecessor contrapôs à 'globalização da indiferença' o convite a sentir a dor dos outros, a ouvir o clamor dos pobres e da terra". "A imagem da grande ponte também ajuda neste sentido. Ao revelar-se, Deus estabeleceu uma ponte entre o céu e a terra: o fez para que o nosso coração mudasse, tornando-se semelhante ao seu. É uma ponte suspensa, grandiosa, que quase desafia as leis da física: assim é o amor, que, além da dimensão íntima e privada, tem também a dimensão visível e pública", sublinhou.
Honrar a dignidade e a liberdade de todos
“A justiça e a misericórdia desafiam a lei do mais forte e ousam pleitear que a compaixão e a solidariedade sejam consideradas critérios de desenvolvimento. Por isso, numa sociedade como a turca, onde a religião desempenha um papel visível, é fundamental honrar a dignidade e a liberdade de todos os filhos de Deus: homens e mulheres, compatriotas e estrangeiros, pobres e ricos. Todos somos filhos de Deus e isso tem consequências pessoais, sociais e políticas.”
"Quem tem um coração dócil à vontade de Deus, promoverá sempre o bem comum e o respeito por todos", disse ainda Leão XIV, recordando que "atualmente, esse é um grande desafio, que deve remodelar as políticas locais e as relações internacionais, especialmente diante de uma evolução tecnológica que, caso contrário, poderia acentuar as injustiças, em vez de contribuir para superá-las".
A importância na família na cultura turca
“Na verdade, até mesmo as inteligências artificiais reproduzem as nossas preferências e aceleram os processos que, bem-vistos, não foram iniciados pelas máquinas, mas pela humanidade. Por isso, trabalhemos juntos para modificar a trajetória do desenvolvimento e para reparar os danos já causados à unidade da família humana.”
A propósito da "família humana", o Pontífice sublinhou que "a família mantém uma grande importância na cultura turca e não faltam iniciativas para apoiar a sua centralidade. Na verdade, é no seu interior que amadurecem atitudes essenciais para a convivência civil e uma primeira e fundamental sensibilidade para com o bem comum. No entanto, não é a partir de uma cultura individualista, nem do desprezo pelo matrimônio e pela fecundidade, que as pessoas podem obter maiores oportunidades de vida e felicidade".
A contribuição feminina na vida social
De acordo com o Papa, "na vida familiar, o valor do amor conjugal e a contribuição feminina emergem de forma muito específica".
“As mulheres, em particular, também através do estudo e da participação ativa na vida profissional, cultural e política, colocam-se cada vez mais a serviço do país e da sua positiva influência no panorama internacional. Assim, são muito apreciáveis as importantes iniciativas nesse sentido, em apoio à família e à contribuição feminina para o pleno florescimento da vida social.”
1700 anos do Concílio de Niceia, encontro e diálogo
A seguir, Leão XIV fez votos de que "a Turquia possa ser um fator de estabilidade e aproximação entre os povos, a serviço de uma paz justa e duradoura". Lembrou a visita à Turquia de quatro Papas – Paulo VI, em 1967; João Paulo II, em 1979; Bento XVI, em 2006; e Francisco, em 2014. Isso "atesta que a Santa Sé não só mantém boas relações com a República da Turquia, mas deseja cooperar na construção de um mundo melhor com a contribuição deste país, que constitui uma ponte entre o Oriente e o Ocidente, entre a Ásia e a Europa, e um ponto de confluência de culturas e religiões". "A própria ocasião desta viagem – o aniversário dos 1700 anos do Concílio de Nicéia –, assim como a recordação de que os primeiros oito concílios ecumênicos foram realizados nas terras da atual Turquia, fala-nos de encontro e diálogo", sublinhou.
“Hoje, mais do que nunca, precisamos de pessoas que promovam o diálogo e o pratiquem com firmeza e paciência. Depois da época da construção das grandes organizações internacionais, que se seguiu às tragédias das duas guerras mundiais, estamos atravessando uma fase de grande conflito a nível global, em que prevalecem estratégias de poder econômico e militar, alimentando o que o Papa Francisco chamou de "terceira guerra mundial em pedaços".”
Enfrentar unidos os desafios
"Não devemos ceder de forma alguma a esta tendência", disse ainda o Papa, ressaltando que "está em jogo o futuro da humanidade" e que a família humana precisa enfrentar unida os desafios como "a paz, a luta contra a fome e a miséria, e também pela saúde, educação e salvaguarda da criação".
"A Santa Sé, com a sua única força, que é espiritual e moral, deseja cooperar com todas as Nações que têm como objetivo o desenvolvimento integral de cada homem e de todos os homens e mulheres", concluiu o Papa Leão.





